Ovalle não queria a Morte
Mas era dele tão queridaQue o amor da Morte foi mais forte
Que o amor de Ovalle à vida.
E foi assim que a Morte, um dia
Levou-o em bela carruagemA viajar - ah, que alegria!
Ovalle sempre adora viagem.
Foram por montes e por vales
E tanto a Morte se apraziaQue fosse o mundo só de Ovalles
E nunca mais ninguém morria.
A cada vez que a Morte, a sério
Com cicerônica prestançaMostrava a Ovalle um cemitério
Ele apontava uma criança.
A Morte, em Londres e Paris
Levou-o à forca e à guilhotina
Porém em Roma, Ovalle quis
Tomar a sua cangebrina.
Mostrou-lhe a Morte as catacumbas
E suas ósseas prateleirasMas riu-se muito, tais zabumbas
Fazia Ovalle nas caveiras.
Mais tarde,Ovalle satisfeito
Declara à Morte, ambos de porre:
- Quero enterrar-me, que é um direito
Inalienável de quem morre!
Custou-lhe esforço sobre-humano
Chegar à última morada
De vez que a morte, a todo o pano
Queria dar uma esticada.
Diz o guardião do campo-santo
Que noite alta, ainda se ouviaA voz da Morte,um tanto ou quanto
Que ria,ria,ria,ria...
Vinícius de Moraes
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